A Criança e o Arquiteto: quem aprende com quem?
Educação

A Criança e o Arquiteto: quem aprende com quem?

19 jan 2015

Convidamos a Andréa Zemp Nascimento, uma amiga querida, arquiteta e urbanista com experiência em projetos com foco no espaço lúdico, na cultura infantil e nas linguagens expressivas da infância, para escrever alguns Posts para o nosso blog. A Andréa faz um trabalho lindo e super interessante, e pode “testar” muitas de suas ideias com a pequena Taina. Aproveitem o texto abaixo, o primeiro de alguns que ela escreverá para o MamisAbroad. Não vemos a hora de receber o próximo!

Trem de caixas

Trem de caixas

Quando se pensa em espaços infantis, o que nos vem imediatamente à mente? O playground, a escola, ambientes produzidos “especialmente” para a criança pelos adultos; “próteses” protegidas dos perigos da cidade, nos quais a criança pode se desenvolver “em segurança” e ultrapassar a fase de “imaturidade” até atingir os “anos plenos de sua cidadania”. Com estes espaços, no entanto, coexistem outros: aqueles ambíguos, híbridos, labirínticos, inacabados e interpretados pela sociedade como sobras; canteiros de obra, construções abandonadas, terrenos baldios, pequenos bosques – que aos olhos das crianças convertem-se em grandes selvas; ambientes caóticos, repletos de objetos aparentemente inúteis. Seja confinada pelas grades do playground ou pelos muros da escola, ou explorando espaços residuais, a criança brinca, faz nascer da apropriação destes ambientes o seu universo. Mas não estaria nestes últimos, nos entre-espaços, a verdadeira essência lúdica, a abertura ao impulso criativo e à ação transformadora da criança? Seria exatamente o fato de estes ainda não estarem preenchidos pela “genialidade” e pelas “mãos” do arquiteto, o motivo de despertarem tanto a atenção das crianças? Como criar lugares repletos do entusiasmo que se revela nos olhos da criança e em seus gestos enquanto constrói, destrói, recompõe seus espaços para brincar?

Todas estas indagações me motivam, há anos, a investigar mais de perto as possibilidades de conceber os espaços da criança de forma a construir com ela um diálogo sensível, que acarrete na invenção novas linguagens criativas coletivas, reinventando, assim, a maneira de se entender e de se fazer arquitetura: apenas PARA, mas COM a criança. A construção desta nova linguagem pode abranger arquitetos, artistas, terapeutas ocupacionais, educadores, psicólogos, etc. No entanto, estes questionamentos podem e devem fazer parte não apenas da prática cotidiana de arquitetos e de profissionais voltados diretamente para a infância, mas da postura de qualquer adulto interessado na criação de um ambiente saudável para o desenvolvimento das crianças – mães, pais, familiares. Este novo olhar exige de todos os adultos envolvidos, uma verdadeira abertura à criatividade, à imaginação e à „liberdade imprevisível“ presente na brincadeira da criança. Está em jogo, portanto, uma parceria sincera entre adulto e criança, na qual a segunda passa a ser vista como sujeito ativo na criação de seus ambientes cotidianos, e não apenas como um passivo receptor de espaços pré- idealizados pelos adultos.

Em meu livro “A criança e o arquiteto: quem aprende com quem?”, originado de dissertação de mestrado realizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (2008), procuro discutir de forma ampla este tema, tanto em termos teóricos – abordando reflexões nos campos da educação, da psicologia, da arte, da arquitetura e da filosofia – como na práxis – através da apresentação de experiências brasileiras e européias que propuseram ou propõem a participação ativa da criança na concepção espacial. Procuro estabelecer um entrelaçamento entre teoria e prática, relacionando um olhar histórico e reflexivo à minha experiência prática em projetos deste caráter, que me possibilitaram entrar em contato direto com crianças e com seu olhar libertador de mundo, permitindo entender mais de perto seu universo, seus anseios, seus sonhos.

Antes da conclusão de meu livro, me tornei mãe. A maternidade só fez fortalecer em mim a crença na força do universo lúdico infantil. Em cada gesto, em cada brincadeira falada, inventada, em cada pequena construcão, minha filha Tainá, agora com três anos e meio, me faz perceber de forma mais intensa, no cotidiano, a energia e o encantamento presentes na „desordem fecunda“ da criança.

FOTOS: Criações da pequena Taina, ao intervir livremente em seus espaços de brincar. (Autoria das imagens: Andréa Zemp Nascimento)

Caminho de livros

Caminho de livros

Castelo

Castelo

Jantar para os bichinhos

Jantar para os bichinhos

Festa das princesas e dos animais

Festa das princesas e dos animais

Me faz, mais do que isso, reviver minha infância, reestabelecer a ligação com este mundo tão rico e tão pleno, que tantas vezes se perde com a chegada da vida adulta.

Nas próximas publicações para o Blog MamisAbroad procurarei indicar alguns caminhos a pais, familiares, educadores e interessados neste tema, no sentido de contribuir para a ampliação do potencial libertador e criativo da criança, no que diz respeito à criação e à recriação de seus espaços de vida. Aguardem!

E para quem se interessar mais profundamente pelo tema, meu livro “A criança e o arquiteto: quem aprende com quem?” será lançado no dia 7 de fevereiro de 2015 na Livraria da Vila, em São Paulo. Nascimento, Andréa Zemp Santana do. A criança e o arquiteto: quem aprende com quem?. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2014. ISBN: 978-85-391-0655-4

Andréa Zemp Nascimento

 

bannerassinaturaAndrea

Com carinho, Mamaes na Suica
Compartilhe o post
Deixe seu comentário